O escritor Ramalho Ortigão, que refletiu sobre os ambientes de jogo e das tertúlias em redor deste divertimento a dinheiro, descreveu em As Farpas, uma experiência sua:
[1]“aquela em que estive, e que denominam o Celeste Imperio, pareceu-me ser um estabelecimento inteiramente respeitável e digníssimo. Recomendo-o vivamente a todos os viajantes, principalmente aos filhos de famílias, aos mancebos morigerados que desejem tornar-se benquistos na sociedade, aos caixeiros de comércio que pretendam estabelecer-se por conta própria, aos que tiverem negócios pendentes dos tribunais ou das repartições do Estado, e finalmente em geral a todos quantos prezarem a sólida convivência de pessoas gradas e doutas, que mais tarde lhes poderão servir de auxilio, de protecção e de arrimo na espinhosa senda da vida!”.
As suas saborosas crónicas descreviam os ambientes que marcavam uma época de enorme entusiasmo, com vivências entrelaçadas nas múltiplas novidades. O lazer imperava em zonas estrategicamente colocadas ao seu dispor.
A propósito respiga-se este parágrafo que descreve bem o contexto:
[1]“uma espessa atmosfera de fumo dos charutos, impregnada dos vapores do álcool, da cerveja e do café, envolve aquele grande ruido. Às portas mulheres do povo, homens de cajados e jalecas ao ombro olham apinhados e em bicos de pés (…). Em todos os cafés há um compartimento suplementar em que se joga o monte ou a roleta; em um deles passa-se da sala do bufete ao jardim, onde se acha a roleta instalada n’um bonito pavilhão.
Descrições de antanho, com marca de um passado que povoava as salas do pano verde.
António Jorge Lé
[1] ORTIGÃO, Ramalho, As Farpas I, Lisboa, Círculo de Leitores, 1987, pp. 118-119.